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domingo, 27 de abril de 2014

A história do Taekwondo

Desenhos antigos da prática 

Sang Min Kim - criador no Brasil


Grupo do CRE Rio Grande

Essa arte marcial faz parte do conjunto de esportes que hoje são praticados no âmbito do Centro de Referência Esportiva Rio Grande. Participando dos Jogos Olímpicos desde 1988 como esporte de exibição, apenas em 2000  foi definitivamente integrado aos programa. A pesar de ser uma luta, esse esporte se enquadra de maneira muito profunda aos elementos mais importantes do esporte educacional, tais como a organização, disciplina, solidariedade, perseverança e companheirismo. Conheça agora as origens dessa arte que tem a sua raiz no que hoje é a Coreia.

Como em todo o mundo oriental as artes marciais fazem parte da cultura dos povos. E na Coreia não foi diferente. Quando ainda não era um país unificado, mas dividido em três grandes reinos, um desses reinos, o de Silla, que perdurou de 935 até 1392, criou um grupo de guerreiros para garantir a segurança. Mas, os chamados “hwarangs” não eram só lutadores, treinados na técnica do taekkyeon. Eles estudavam história, a filosofia confuciana (do filósofo Confúcio) , ética e a moral budista (do avatar Buda). Para os combates, eles treinavam com lanças, arco e flecha, espada e também praticavam a disciplina mental, desenvolvendo várias formas de lutas com os pés e as mãos, como o soo-bak e o taekyon (antigas artes marciais coreana que originaram o Taekwondo). Assim, ser um guerreiro implicava também ser um homem do saber, capaz de compreender o mundo. Com o início de uma nova dinastia, as artes marciais perderam sua centralidade, mas jamais foram esquecidas. E apesar da passagem dos séculos, das invasões japonesas e de um longo período de isolamento, as técnicas da luta dos antigos guerreiros foram sendo repassadas.  

Foi no início do século XX que a arte marcial coreana renasceu com bastante força. Com o país ccupado pelos japoneses os coreanos foram vendo sua cultura definhar, e assim, decidiram impulsionar a prática do Taekkyeon, obrigando a todos os que ingressavam na carreira militar a aprender a luta. Muitos mestres tinham saído pelos caminhos do Oriente e voltavam com novas técnicas, incorporando-as à antiga forma de lutar. Quando finalmente os japoneses saíram da Coreia em 1945, a arte deixou de ser clandestina e passou a ser ensinada em escolas, chamadas de kwans. Assim, surge o taekwondo, uma espécie de mistura entre a velha arte e as outras formas de luta aprendidas na China e no Japão. O nome taekwondo aparece em 1955, a partir da proposta do general Choi Hong Hi, de unificação de várias escolas e modalidade da luta.  

Como toda a arte marcial, o taekwondo é muito mais do que uma luta. Está impregnado dos conceitos filosóficos milenares do mundo oriental. A própria origem do nome do esporte já remete a esse aprofundamento espiritual. Tae (significa pé), kwon ( significa mão) e do ( é o espírito, o caminho). Assim, na prática sistemática dos golpes e das técnicas, o aprendiz se conduz pelo caminho do espírito. 

O taekwondo é uma técnica de combate sem armas, específico para a defesa pessoal e tem como principal ponto a destreza nos pés e mãos, que constituem golpes capazes de vencer o oponente. Essa arte foi introduzida no Brasil pelos mestres Sang Min Kim, Yeo Jim Kim e Kun Mo Bang, no ano de 1970. Depois vieram outros e a luta foi se desenvolvendo. Não é sem razão que uma das mais importantes representantes do taekwondo no mundo é uma brasileira, Natália Falavigna. 

Ser um praticante do taekwondo exige muito mais do que a habilidade com os pés e mãos. Ao longo do aprendizado, o aluno passa por gubs e dans. Cada gub corresponde a uma faixa colorida. Elas vêm para o aluno em ordem decrescente e quanto menor o número significa que mais ele tem desenvolvido o senso de humildade. Cada cor simboliza algum valor importante para o ser humano. 

Já o dan  corresponde a graduação de faixa preta. Essa segue a ordem crescente até o 10. Quanto maior o dan maior é o desenvolvimento dos conhecimentos e aprimoramentos da arte. A cor preta simboliza dignidade, dedicação, postura e liderança.

Na arte marcial as cores não são apenas adereços. Elas são baseadas na tradição. As pretas, vermelhas e azuis representam as hierarquias existentes durante as dinastias Koguryo e Silla. 

Para todos os que praticam a arte marcial. Muito mais do que o esforço corporal, os ensinamentos filosóficos são os que marcam o espírito, garantindo um ser em equilíbrio.

sábado, 26 de abril de 2014

Formação Continuada

Entrevista com a professora Denise Z. Porto, realizada durante encontro de formação promovidos pelo Centro de Referência Esportiva Rio Grande.

quinta-feira, 24 de abril de 2014

A Copa vem aí

Foto: Paquito Masiá

por Elaine Tavares

Desde bem menina gosto de futebol. Era comum acompanhar meu pai, repórter esportivo, aos jogos dos dois clubes que havia em São Borja: Cruzeiro e Internacional. Meu coração pendia irremediavelmente para o Inter. Não sei o motivo. Nunca soube. Apenas amava aquela camisa vermelha brilhando ao sol. Quem pode saber o que nos faz amar algo ou alguém? É coisa que nos toma e não há explicações a dar. Já, em Porto Alegre, era o Grêmio que me tinha. Como entender essa confusão? Impossível. Amor! O rolo só se desfez quando Cruzeiro e Inter se fundiram dando lugar ao São Borja. Fiquei só com o Grêmio. E, assim, o futebol foi encontrando seu lugar na minha vida. A bola rolando, os dribles, os meneios de corpo, as firulas, o voleio, o gol. Nunca me importei com ganhar ou perder. Apenas me encanta aquela correria no quadrado, a arte de dominar a bola.

Há 24 anos vivo em Florianópolis e por força da profissão me vi setorista do Figueirense, escrevendo para o Jornal "O Estado". Em pouco tempo o furacão do estreito já tinha me ganhado, apesar de o Avaí ser azul, como o Grêmio. De novo, o não-sabido, o incompreensível. Importa não. O que vale é aquela alegria que assoma na hora do gol.

Repórter de esporte sempre soube o que estava em jogo no futebol. O espetáculo é uma mercadoria do capital, feito para render lucros a alguns. Também sempre tive muito claro que os mais variados esportes, entre eles o futebol, são, como muito bem aponta o professor Nilso Ouriques, no livro Megaeventos Esportivos, "produtos de transplantes culturais produzidos pelas elites ociosas", em busca de elementos culturais e simbólicos que garantissem riqueza e poder. Tanto que o futebol, introduzido no Brasil pelos ingleses e jesuítas, era um jogo da elite, completamente proibido para os pobres. Igualmente compreendo o papel do Estado na institucionalização do esporte, iniciada em 1941, com os dirigentes políticos do país definindo que confederações e federações poderiam existir. Obviamente um espaço dominado e atravessado pelo jogo do poder. 

Nos anos 50, quando o Brasil se associa definitivamente ao universo dos dois maiores eventos esportivos, as Olimpíadas e a Copa do Mundo, toda essa herança de coronelismo, clientelismo, desmandos e corrupção se fortalece e, desde aí, estamos cada dia mais submetidos à lógica do esporte/espetáculo/mercadoria, sem mudanças no quadro político.

Mas, apesar de tudo isso, a vida mesma se encarrega de colocar sua cunha nos planos das elites. E o futebol, antes proibido aos pobres, ganha as ruas e dos campinhos de várzea começam a brotar craques. Sem poder fazer vistas grossas aos ídolos dos campinhos, os clubes se abrem e incorporam os negros e os jogadores da periferia. Espertamente, se apropriam da beleza criada nas ruas e acabam inventando uma sofisticada forma de escravidão. Em pouco tempo, os jogadores passaram a ser comprados e vendidos como se fossem coisas. Mas, vez em quando, eles subvertem a ordem, que o digam Sócrates, Casagrande, Nelinho, Éder, Albeneir, Renato e tantos outros. É a dialética.

É nessa contradição, entre a arte da rua, com o jogo sendo puro prazer, e o espetáculo montado para uns poucos ganharem dinheiro, que seguimos. Nesse sentido, parece muito importante compreender o caldo onde estamos metidos quando falamos de futebol. Não é só esse espaço de amor intraduzível que nos toma de paixão. É também campo de luta de classe e de confrontação com o sistema capitalista que oprime e exclui. 

Assim, por compreender todo o jogo político e de poder que se mistura ao esporte, é que fiz coro ao grito de "não vai ter Copa" que tomou o país quando começaram as obras faraônicas e inúteis dos estádios novos, financiadas com dinheiro público para que meia dúzia de empresários tenham lucros exorbitantes. Porque, além de o governo permitir que poucos encham os bolsos, ainda é responsável por toda a sorte de destruição da vida que advém dessas. Mortes de operários, remoções forçadas de milhares de famílias, gente que tem suas casas destruídas, que não têm para onde correr, que não recebe uma indenização justa, que não tem chance de discutir uma opção. Tudo feito de forma autoritária e impiedosa, porque é da natureza do sistema capitalista não se importar nenhum pouco com aqueles que explora. Não são pessoas, são números, cifras, entraves, coisas, que podem ser removidas ou eliminadas. Tanto faz.

Não se trata de ser oposição cega à Dilma, à Lula ou ao PT, e muito menos de atuar na lógica da direita - que faria exatamente a mesma coisa que hoje faz o governo do PT. É uma posição clara diante do que representa para a maioria das gentes essa "festa do futebol". A festa mesmo será apenas para muito poucos. Os turistas que podem pagar os preços exorbitantes dos ingressos, as grandes redes de hotéis e restaurantes e principalmente as grandes empresas transnacionais que "patrocinam" o evento. Afinal, por força de lei, apenas os seus produtos poderão ser comercializados. Nem mesmo os ambulantes, que acabam pegando carona nos grandes eventos, com seus badulaques falsificados, poderão comer as migalhas desse banquete. Conforme a Lei da Copa, se forem pegos vendendo coisas nas proximidades dos estádios, serão presos. 

Sempre haverá aqueles que dirão: "melhor, não teremos pobres enchendo o saco na entrada dos estádios". Mas, fatalmente, esses "pobres" saltarão nas suas caras quando menos esperarem, porque afinal, os estádios podem ser uma bolha protegida, mas a vida não é. E a violência que hoje se mostra quase endêmica não brota do nada. Ela é fruto do processo de exclusão e desumanização promovido pelo capital. Sabe-se que há uma camada até significativa da população que acredita piamente nas benesses que a Copa vai trazer. Confia nas mensagens de propaganda sobre melhorias nos transportes ou em outras questões estruturais. Mas, aqueles que sabem, que conhecem a raiz dos eventos e sua origem, não podem dar-se ao luxo do engano, ou da visão ingênua. Por isso dizem "não vai ter Copa".

É certo que os movimentos contrários ao evento não lograram vencer a batalha de ideias, afinal, a ideologia vomitada pelos meios de comunicação acabou prevalecendo. Assim, é certo também que os jogos vão acontecer, ainda que certamente cercados de protestos, lutas, prisões, violências, como soe acontecer quando o poder decide solapar a crítica. Porque a responsabilidade daqueles que sabem assoma, a despeito das ameaças de, inclusive, enquadrar os que ousarem lutar em lei de segurança nacional, como terrorista.

Então, para aqueles que, sem argumento, preferem enxovalhar os que lutam com comentários do tipo: "são contra a Copa, mas vão ver os jogos", "são do contra, mas vão torcer para o Brasil", tenho a obrigação de dizer que precisam se informar melhor sobre o tema. Ser contra os gastos públicos exagerados, contra o domínio das multinacionais, contra o evento caça níquel, contra os novos senhores de escravos, ou contra os figurões da Fifa, não tira de nós o amor que constituímos pela arte do futebol. Uma coisa não tem nada a ver com a outra e só usa esse tipo de argumento quem não quer ver a realidade.

O esporte, seja ele o futebol, ou outro qualquer, está para além dos jogos vorazes do capital. A alegria do jogo, a festa dos corpos brincantes ultrapassa a dominação a qual os cartolas e políticos insistem em impor. E desses corpos em festa sempre há de escapar a flor deliciosa do prazer que se esconde no drible perfeito,  no gol de placa. E, nessa hora, vamos vibrar, sim. A diferença é que a gente sabe muito bem o que tudo aquilo significa, qual aparato está montado e a quem serve, em última instância.

Nos dias da Copa vamos ver, sem dúvidas, toda essa nossa gente sofrida, excluída do banquete, espremida em frente às lojas que apresentarem grandes televisores, vibrando pela seleção do Brasil. Mas, não se iludam. Mesmo aqueles que não sabem, na sua pureza, vibram pela beleza do jogo. E, apesar de estarem mergulhados até o pescoço na armadilha do capital, haverão de encontrar - alguns - o caminho de saída. A Copa é só mais uma batalha ideológica do  sistema que nos oprime. Outras virão. Seguiremos lutando, engordando os batalhões...

O Esporte Educacional como pilar

Entrevista com Glauber Fonseca Cruz, professor em Santa Vitória do Palmar, sobre o Esporte Educacional.

terça-feira, 22 de abril de 2014

O Esporte Educacional - desafios e limites

Durante o encontro de formação de professores da Rede Parceiros Multiplicadores de Esporte Educacional, realizamos entrevista com o professor Carlos Alberto Pereira da Silva - o Paulista. Com 25 anos de profissão, ele aponta os desafios e os limites dessa forma de pensar o esporte nas escolas.  

À caminho da Copa

O documentário "A Caminho da Copa", desenvolvido pelo Ponto de Mídia Livre Pólis Digital, aborda a diversidade de opiniões a respeito dos impactos, positivos e negativos, da preparação dos megaeventos no cotidiano das principais cidades brasileiras. Raquel Rolnik, Carlos Vainer, Juca Kfouri, Toni Sando, Vicente Cândido e moradores de São Paulo e Rio de Janeiro atingidos por obras urbanas ligadas aos eventos da Copa do Mundo e Olimpíadas são entrevistados no filme.

sexta-feira, 18 de abril de 2014

Rio Grande, um Centro de Referência Esportiva


Professores em atividades de formação


Por Elaine Tavares

Há pouco mais de um ano, um grupo de pessoas ligado ao esporte decidiu incluir a cidade de Rio Grande num circuito de referência na área. Mas, a proposta de esporte que saiu da cabeça não foi a do esporte de rendimento, esse que procura levar o humano ao seu limite de resistência, obrigando-o a vencer dia a dia a si mesmo, num interminável processo de competição que, se pode levar à glória, também pode provocar desgaste e destruição. A proposta esportiva que brotou dentro da sede do histórico Sport Club Rio Grande (o primeiro time de futebol do Brasil) foi a que se baseia no conceito de esporte educacional. Ou seja, um esporte para ser aprendido na escola, um esporte que possa ser praticado por não atletas, por pessoas comuns que apenas querem fazer de seus corpos espaços brincantes.

Foi assim que começou a ser construído o projeto da criação de Centro de Referência Esportiva que acabou sendo incorporado a um outro projeto maior, proposto e financiado pela Petrobras. As coisas acabaram casando, pois a Petrobras estava interessada em investir em projetos sociais na cidade que hoje abriga um dos mais importantes polos navais do país. Assim, o projeto foi feito e desde há pouco mais de um ano, está em andamento. Vinculado a uma proposta maior da Petrobras, o CRE Rio Grande tem vida própria e está consolidado a partir da vocação da cidade, que por sua geografia, parece estar fadada ao esporte, ainda que precise enfrentar seus desafios.

Rio Grande é um dos município mais antigos do sul brasileiro, existindo nos mapas holandeses, bem antes da invasão portuguesa. Originariamente era espaço dos chamados índios carijós, que hoje sabe-se eram Guarani, mas também conformava parte do território minuano, ao norte. Com a chegada dos portugueses e o avançar sistemático para o sul, a ocupação militar do pequeno povoado se deu em 1737, quando Silva Paes fincou as bases do Forte Jesus Maria José na desembocadura do Rio São Pedro, que liga a Lagoa dos Patos ao Oceano Atlântico. A partir daí chegaram as famílias e a vila Rio Grande de São Pedro nasceu. O nome Rio Grande foi inspirado na enorme desembocadura da Lagoa dos Patos e, mais tarde, acabou dando nome ao estado inteiro.

O espaço da vila de Rio Grande era bastante estratégico para os portugueses, uma vez que fazia a ligação entre o importante porto de Laguna e a colônia de Sacramento, localizada no Rio da Prata. Hoje Rio Grande tem 240 quilômetros de praia, que podem ser percorridos de carro até o Uruguai. É a maior extensão de praia do mundo, com mar leve, bastante propício aos esportes náuticos e com larga faixa de areia, também espaço privilegiado para uma série de outras modalidades esportivas. De relevo plano, com 11 metros acima do nível do mar, a cidade não tem subida, constituindo-se o lugar perfeito para o uso da bicicleta ou do skate.

E é nesse espaço que hoje atua o Centro de Referência, buscando dar vazão a essa vocação esportiva e tentando oferecer alternativa de lazer às milhares de crianças que conformam a população infanto-juvenil da cidade. Nos bairros da periferia, próximo ao porto, ou mesmo no centralíssimo BGV (Bairro Getúlio Vargas), os pequenos estão pelas ruas buscando diversão, sem encontrar espaços adequados ou políticas públicas que possam dar consequência a toda essa demanda. Por enquanto, o Centro de Referência está mais vinculado ao trabalho nas escola, com ênfase na formação de professores. Mas, nos planos daqueles que coordenam o projeto, a atuação junto aos professores visa também dar a eles instrumentos e condições de intervir na proposição de políticas para o município. É um trabalho gigante, que está no começo, mas já gera frutos.

A cidade como espaço brincante






Um passeio pela cidade de Rio Grande mostra toda a potencialidade de uma cidade que pode ser também referência no campo do esporte. A faixa de areia que se estende por quilômetros é espaço perfeito para a montagem de equipamentos esportivos que, gratuitamente, podem envolver a população em atividades corporais prazerosas e divertidas, juntando a beleza da praia com a prática da boa saúde. Os molhes que entram mar adentro por mais de quatro quilômetros podem ser arquibancadas para uma série de atividades náuticas, uma vez que o mar não é encapelado e se presta a todo o tipo de esporte. As baias, serenas e piscosas podem se transformar em prazerosas raias de remo e canoagem. As ruas largas e arborizadas são perfeitas para a bicicleta, precisando apenas de investimento na área de ciclovias. Há também uma beira-mar que se estende por todo um bairro, hoje bastante degradada, mas que, com investimento público, pode vir a ser um modelo de espaço esportivo e de lazer para toda a cidade.

Na área central, onde fica o antigo porto dos pesqueiros, o mercado público, a igreja, a praça, os barcos que seguem atracando, tudo remete a uma profunda beleza. A história aparece brilhante, na arquitetura, nos cheiros, na conformação de um espaço. As casas antigas bem próximas ao mar, a vista da água que se tem desde qualquer rua do centro, a venda do peixe que tradicionalmente segue acontecendo todos os dias num pequena pérgola, repleta daquele universo marítimo que fez de Rio Grande a princesinha do sul, tudo se faz tão bonito. È como caminhar por um tempo bem antigo, ao mesmo tempo em que a modernidade se anuncia na profunda divisão de classe, visível em cada passo, nas barracas de badulaques que brotam em meio à praças e passeios. Gente em luta para sobreviver. A grande Praça Tamandaré abriga um parque de beleza única. Lagos, nichos de animais, esculturas e, bem no centro, o mausoléu de Bento Gonçalves, um dos fazendeiros líderes da revolta gaúcha que deu origem à revolução Farroupilha – incorporada pelas gentes - e que tornou o Rio Grande a primeira república livre do mundo colonial português. A grandeza da história passada, misturada a história de hoje, equilibrando-se entre lutas e apatias.

Essas maravilhas encontradas pela área central se misturam, contraditoriamente, com a parte industrial da cidade que fica para o lado do porto novo. Empresas de fertilizantes, de produtos químicos, refinarias, indústria naval, um universo cinza, fumacento, de imensa poluição e de grande pobreza ao redor. A parte responsável pelo terceiro maior PIB do estado é também a que provoca doenças, miséria e exclusão. Agora, com a revitalização do polo naval que prevê a construção de uma imensa plataforma da Petrobras, os empregos aparecem, mas não são para todos, o que significa que uma parte significativa das gentes continuará vivendo pelas beiradas dos grandes empreendimentos numa condição de profunda pobreza. Bairros mais afastados como os que ficam na região da universidade, ou mesmo o tradicional BGV, bem no centro da cidade, carecem de qualquer estrutura de lazer e vida para crianças e jovens, que brincam nas ruas..

É nessa realidade que se move o Centro de Referência Esportiva, com atividades que se desenvolvem nas dependências do Sport Club Rio Grande e no Clube de Regatas. Atualmente o projeto atua na capacitação de professores, visando dar a eles instrumentos de ensino capazes de tornar o esporte na escola um momento de alegria e não apenas de competição. Na perspectiva do esporte educacional, o esporte é trabalho não para tornar a criança um atleta de rendimento, mas alguém que saiba jogar com prazer, de forma cooperativa e solidária, conhecendo as regras dos jogos e atuando na sociedade como sujeito da história. Uma maneira de capacitar para a criticidade aquelas crianças que vivem na carência econômica e de estruturas públicas.

Mas, para além da formação de educadores de nove cidades da região, o Centro ainda realiza uma infinidade de atividades esportivas com mais de 700 crianças vinculadas ao projeto. Festivais, passeios e toda sorte de atividades esportivas que envolvem não apenas os jovens, mas também os pais. É uma forma diferente de pensar o esporte que vai se enraizando. Para os professores que agora encontram na formação oferecida pelo CRE uma forma concreta de reciclar os conhecimentos, de inventar novas brincadeiras e materiais brincantes, o projeto é uma brisa fresca em anos e anos de atuação. A aula de educação física, no âmbito do esporte educacional, deixa de ser um espaço ritual e passa a comandar um poderoso momento de reconhecimento das capacidades dos alunos nas suas mais diferentes habilidades. Ninguém fica excluído por ser baixo, gordo, alto ou desengonçado. Todos encontram seu lugar no jogo e se divertem. O esporte educacional não visa formar atletas, mas pessoas cooperativas. É claro que se o atleta aparecer, também vai encontrar espaço para se expressar e seguir seu caminho. Mas, a escola não é o espaço para treinamento de rendimento. É lugar de apender a ser criança feliz, brincante, solidária e sujeito histórico.

Rio Grande vai caminhando e espalhando essa ideia. No ritmo do mar do Cassino, mansinho, mansinho...

terça-feira, 15 de abril de 2014

Centro de Referência Esportiva promove formação







Faz frio na cidade de Rio Grande, mas na bonita Praia do Cassino poucos parecem se importar com o vento geladinho. Pois é ali que dezenas de pessoas se encontram para compartilhar saberes e brincadeiras. São professores  e professoras de educação física de oito cidades da região de Rio Grande vivenciando um curso de formação coordenado pela Rede Parceiros Multiplicadores do Esporte Educacional, ligada ao Instituto Esporte & Educação, que tem à frente a jogadora de vôlei Ana Moser. O grupo faz parte do projeto Esporte e Cidadania, de esporte educacional, patrocinado pela Petrobras e desenvolvido pelo Centro de Referência Esportiva, que entra agora no seu segundo ano.  

A tarefa dos professores é avaliar o trabalho desenvolvido com os alunos da rede pública, conversar, trocar experiência, aprender novas abordagens para as atividades esportivas e construir coletivamente instrumentos brincantes. Não é sem razão que a sala é uma festa. Misturam-se risos com chimarrão, abraços com teoria e, juntos, eles vão tecendo um mosaico de saberes que vai desembocar lá na escola, bem como nas atividades do Centro de Referência Esportiva.

Nesse processo o caminho teórico é o do esporte educacional, uma proposta que faz da hora da educação física não um momento de tortura ou de "fazer nada", mas espaço de formação de um sujeito crítico, ativo politicamente, brincante e cooperativo. Essa abordagem preocupa-se muito mais com o prazer do jogo, a inclusão de todos conforme suas habilidades, a solidariedade, do que com a competição. Vale movimentar o esqueleto com alegria, promovendo saúde e bem estar. Além disso trabalha na criança e no adolescente valores que o tornam melhor pessoa na relação com o coletivo.

Para os professores das redes públicas municipais que participam do encontro, essa é uma oportunidade única de reorientar as atividades da educação física na escola, amparada num arcabouço teórico que passa pela construção coletiva, tanto do conhecimento como dos materiais utilizados nos jogos e brincadeiras. Como o Estado, via de regra, não provê a formação continuada, é nesses projetos que os educadores encontram espaço para a troca de informação e para o aprimoramento de suas práticas. 

O encontro dura dois dias e alterna discussão com atividades práticas, para que os professores possam vivenciar aquilo que depois dividirão com os alunos. A metodologia participativa torna tudo muito lúdico, exatamente como tem de ser o próprio ensino esportivo. E, por se reconhecerem protagonistas desse momento educativo, o que se vê no rosto de cada um é comprometimento, paixão, emoção e alegria. Elementos essenciais para se vivenciar numa sala de aula, ou num pátio de atividades desportivas. Assim, a educação vai se transformando. 

sábado, 5 de abril de 2014

O Esporte Educacional como espaço de construção humana
















Por Elaine Tavares 

Eliane é frágil e pequena demais para jogar vólei, o esporte que a escola decidiu adotar nas aulas de educação física. Como as aulas são obrigatórias, ela não tem escapatória, precisa comparecer. Durante os jogos, o sofrimento é contínuo. Ela não consegue dar um saque eficiente, é incapaz de fazer bloqueios e o sonho da cortada perfeita não tem qualquer chance. O resultado de suas infrutíferas tentativas é o escárnio e a humilhação. Quando é dia de aula e são formados os times, todos fazem figa para não ter que ficar com a pequenina. E os que são “sorteados” reclamam sem parar. Em casa, Eliane chora. Inventa mil doenças para não participar das aulas de educação física e, cada dia que passa, o esporte assume para ela o aspecto de uma tortura. Mais tarde, já crescida, ela é só mais uma que foge do esporte como o diabo da cruz. Nunca conseguiu realizar práticas esportivas que fossem cooperativas e solidárias. O resultado dessa trajetória é uma vida sedentária e despida de atividades físicas. 

Pois todos esse sofrimento vivido por Eliane não precisa mais ser vivenciados por outras crianças, porque hoje já existem outras metodologias de ensino na educação física. Uma delas é a proposta do esporte educacional, que busca a participação ativa de todos os jogadores, superando as causas da exclusão. Nesse processo, uma garota pequenina pode jogar vôlei, desde que o professore orientador encontre, junto com ela, uma forma de atuar no jogo que não exija fundamentalmente a altura. O mais importante é a integração e a cooperação solidária, sem chacotas nem humilhações. 

O Centro de Referência em Esporte Educacional de Rio Grande atua desde 2013 envolvendo mais de 600 crianças e adolescentes em um projeto de esportes que se ampara na proposta do esporte educacional. Isso significa que a finalidade das atividades esportivas realizadas não é a competição nem a lógica do rendimento corporal levado ao limite das forças humanas. Pelo contrário, a proposta é democratizar a prática desportiva gerando uma nova cultura, na qual o individuo atua na relação com os demais e com a natureza. A formação corporal está mais ligada ao lazer a ao exercício crítico da cidadania, buscando construir uma sociedade livremente organizada, cooperativa e solidária. Um proposta muito mais universalista do que a de competir individualmente buscando vitórias isoladas da realidade social da comunidade.

A proposta do esporte educacional se ampara em cinco princípios básicos: autonomia, inclusão, construção coletiva, educação integral e respeito à diversidade. E é a partir desses elementos que todas as ações do CRE Rio Grande são realizadas.  Durante as dezenas de atividades com pelo menos seis tipos de esporte o objetivo primeiro é criar condições para que as crianças e os adolescentes participem das brincadeiras, integrando cada um no processo de ensino e aprendizagem do esporte. Professores, alunos e comunidade são co-participantes, interagem, construindo as atividades de forma coletiva. Os professores são capacitados para perceber, reconhecer e valorizar as diferenças entre as pessoas, fazendo com que os jogos tornem-se prazer e não sofrimento. 

O esporte, dentro desta proposta é visto como um meio para a constituição de uma educação emancipatória, superando assim a lógica hegemônica que vigora, e que torna o esporte um espaço de exclusão, violência, sexismo e elitismo, com a imposição de um modelo, muitas vezes gerado pela mídia, sem ligação alguma com a vida real.

No contexto do esporte educacional, a prática desportiva é encarada como jogo, de modelo aberto, diversificado, imprevisível, espaço de ousadia, de risco, de criação coletiva, motivado pelo envolvimento do grupo. Já na lógica do esporte como exercício de modelagem do corpo ou de competição o modelo é fechado, previsível, mecânico, automatizado, desinteressante e individual. Assim, nas atividades do CRE os elementos que definem um bom jogo, ou uma saudável prática esportiva, são aqueles que possibilitam a participação de todas as crianças, com suas habilidades diferenciadas, que mantêm a imprevisibilidade, que permitem adaptações, novas aprendizagens e auto gerenciamento dos jogadores, bem como permite o sucesso de todos os participantes. Nesse sentido, todos sempre são ganhadores e não é gerado nenhum sentimento de inferioridade ou exclusão. 

É por conta disso que os educadores estão sempre buscando dinâmicas que evitem qualquer constrangimento para as crianças envolvidas, que valorizem o esforço pessoal de cada um, mas sempre integrando ao grupo. Para que isso aconteça os jogos nunca são muito fáceis, nem muito difíceis. São desafiadores, logo, motivam os jogadores a investir esforços para aprimorar a brincadeira. Daí a importância da cooperação como princípio básico. Se todos cooperam, os resultados chegam mais rápido. O que conta mais é a experimentação, a ousadia, a capacidade de criação. No esporte educacional os educadores não querem ensinar ninguém a ser Pelé, mas a encontrar a sua melhor forma de jogar.

Nas atividades desenvolvidas pelo CRE Rio Grande esses elementos têm sido os pilares do trabalho. Não é sem razão que as crianças participam com entusiasmo e alegria. Todas elas sabem que em cada brincadeira podem se aprimorar dentro das habilidades que possuem. Nada é imposto, tudo é dividido. Assim, busca-se construir também uma outra forma de agir na sociedade. Se em atividades tão lúdicas como os jogos esportivos as crianças aprender a ser solidárias e cooperativas, nas demais atividades da vida cotidiana isso vai aparecer e a vida pode ficar bem mais bonita.

quinta-feira, 3 de abril de 2014

O Brasil e a Copa

Conferência do jornalista Juca Kfouri, durante as Jornadas Bolivarianas, evento anual do Instituto de Estudos Latino-Americanos. Nela, ele faz uma dura análise da situação do esporte brasileiro, da cartolagem e da Copa do Mundo.